Depois da gravação do disco com o “Silvan”, eu decidi que não iria mais cantar. Minha interpretação, tecnicamente era boa, mas, o timbre da minha voz deixava muito a desejar. Na verdade eu possuía um grave possante, firme, mas o som da minha voz era feio, embaçado, sem expressão. Tipo de voz que as pessoas ouvem, gostam, mas não sentem. Existem vozes que tem aquele ‘algo’ que vai direto ao ponto onde está instalado o sentimento de quem ouve. Se é num cantinho do coração, num compartimento da mente ou nos recônditos da alma, eu não sei. Descobri apenas que é em algum desses pontos que a voz e a música precisam chegar para se tornarem sucesso. Analisando tudo isso, cheguei à conclusão de que meu negócio não era cantar. Felizmente, minha autocrítica sempre foi muito apurada.
Minhas composições estavam cada vez mais, atingindo o público, á quem eram destinadas, e isso era o bastante para alimentar o meu ego, minha vaidade pessoal e o meu anseio de mostrar ao mundo, as mágoas, as esperanças perdidas, contidas nas minhas histórias de amor, mal resolvidas. Mas, voltemos às inesperadas visitas que recebi, quando ainda era funcionário da EDEC. O Luiz Salatiel era o "Venancinho" e o Francisco Adão era o "Nhozinho", dois integrantes do mais perfeito Trio Sertanejo que o Brasil conheceu. O Trio da Vitória. Chegaram, e foram logo riscando o verbo. O terceiro, e mais importante integrante do Trio, o Venâncio, por motivos pessoais teria que parar de cantar, por algum tempo. E por ironia do destino, eu havia sido o escolhido para substituir, temporariamente, o artista que era um ídolo para mim e para o Brasil.
Na minha concepção, o “Venanção”, como eu o chamava, pela liberdade que a nossa amizade me permitia, era coisa única, absolutamente insubstituível. Mas, era uma situação de exceção, e haviam vários compromissos agendados, inclusive a gravação de um LP, na gravadora Califórnia, além de shows e apresentações diversas, que não poderiam ser canceladas. Demorei um pouco, a me decidir, mas acabei por fraquejar, na minha decisão de não mais cantar, profissionalmente. Mais uma vez fugi da realidade, para perseguir uma miragem.
E lá fui eu, fazer parte do Trio Sertanejo mais importante de Goiás e que estava entre os mais famosos do Brasil, o TRIO DA VITÓRIA. Deu tudo errado. Substituir o Venâncio era algo humanamente impossível. O homem tinha liderança, tinha segunda voz inigualável, impunha sua personalidade com uma presença marcante e, além disso, era o “cabeça” do trio. Sabia vender seu peixe com a habilidade de mestre. Mesmo assim, colaborei com o Luiz Salatiel (Venancinho) e o Francisco Adão Gonçalves (Nhozinho) cumprindo os compromissos assumidos, inclusive gravando o tal LP, estipulado em contrato.
Gravamos, mas, quando ouvi o nosso disco e o comparei com os discos do verdadeiro "Trio da Vitória" confesso que tive vergonha. O nosso disco foi um fiasco era ruim mesmo. A interpretação não convencia, o repertório era fraco, os arranjos eram pobres e as condições técnicas, sofríveis. A única faixa daquele LP que conseguiu um pequeno destaque junto ao púbico foi uma música de autoria do Zé do Rancho e Pirassununga, intitulada "Manhã do Nosso Adeus".
Então resolvi dessa vez de maneira definitiva, em caráter irrevogável, que ninguém, ninguém mesmo, nunca mais me convenceria de "enfiar" minha voz, num disco. Anunciei minha decisão ao Luiz e ao xará, lhes dei liberdade para encontrarem outro parceiro até que o "Venâncio" reassumisse sua posição de titular, e, me despedi de vez, da carreira de intérprete de música sertaneja. Passei a ser apenas: Marrequinho, o compositor.
Estávamos em 1969.
TRIO DA VITÓRIA: MARREQUINHO, VENANCINHO & NHOZINHO ÁLBUM JARDIM DE AMOR |
Lado A
1 – EU E A BRISA – Marrequinho – Fleury Rodrigues
2 – CORAÇÃO MAGOADO – Venancinho – Ubirajara Moreira
3 – JARDIM DE AMOR – Zulma Moraes - Venancinho
4 – MANHÃ DO NOSSO ADEUS– Zé do Rancho - Pirassununga
5 – CANÇÃO DE AMOR - Venancinho
6 – NINGUÉM É DE NINGUÉM – Campeão
Lado B
1 – NÃO E NÃO– Jorival dos Santos - Venancinho
2 – CARRO DE BOI - Coqueiro
3 – GOTA DE ORVALHO – Marrequinho – Ubirajara Moreira
4 – FOFOCAS DE ALGUÉM – Miltinho Rodrigues
5 – OITO ANOS– Marrequinho – Campeão
6 – TEU ADEUS - Loirinho
Contato com Marequinho:
Twitter: http://twitter.com/#!/Marrequinho1
Palco Mp3: http://palcomp3.com/marrequinho/
* Vigésimo capítulo do livro "Marrequinho - O Menino de Campo Formoso", de Francisco Ricardo de Souza. Imagens: Acervo Pessoal de Marrequinho. Publicação autorizada pelo autor. Todos os direitos reservados.
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